Por Denise Hamú e Rafael Zavala* para Correio Braziliense
O Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho, acontece em um momento ímpar para o nosso planeta e para os que aqui vivem. Cada vez mais percebemos o quanto somos dependentes dele — e de toda a sua biodiversidade.
Diante da pandemia do novo coronavírus, que já infectou mais de 6 milhões de pessoas em todo o mundo, é necessário olhar com atenção para a mensagem que a natureza está nos mandando. O ar que respiramos, a água que bebemos e o alimento que ingerimos nos são oferecidos pela natureza e, para que estes recursos naturais continuem a existir, precisamos unir esforços para resgatar um delicado equilíbrio.
Esta é uma oportunidade única de conscientização de toda a comunidade global sobre a importância de garantir a saúde do planeta para acabar com a fome, reduzir a pobreza e impulsionar o desenvolvimento econômico. É fundamental garantir que os planos de recuperação estejam alinhados à sustentabilidade, com o objetivo de mudar muitos dos atuais padrões insustentáveis de consumo e produção. Esta não é uma missão impossível.
Agricultores comprometidos com a produção sustentável, pescadores e silvicultores, pastores e povos indígenas, atuam como guardiões do meio ambiente. Em todo o mundo, a população rural precisa estar no centro da mudança – para garantir segurança alimentar e que a biodiversidade seja mantida e os recursos hídricos e da terra sejam preservados.
No Brasil, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) atua como uma das agências implementadoras do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (Global Environment Facility, GEF na sigla em inglês), que auxilia os países em desenvolvimento na busca por soluções em relação à proteção dos ecossistemas e à biodiversidade, para garantir a redução dos impactos causados por ações humanas, e evitar o colapso dos sistemas de alimentação e saúde.
Um importante exemplo é o Projeto Ecossistema na Baía de Ilha Grande (RJ), que empoderou a comunidade local, descentralizou o processo de tomada de decisão e impulsionou o uso de tecnologias para garantir a promoção de conhecimento e a proteção da água. Como resultado, a região garantiu o equilíbrio do crescimento industrial e econômico, preservando os recursos naturais e o ecossistema.
Em 2020, com recursos GEF de 5 milhões de dólares, a FAO ainda irá apoiar o processo de elaboração de um projeto binacional entre Uruguai e Brasil, na bacia da Lagoa de Mirim (RGS), para trabalhar o uso sustentável e eficiente da água, a preservação de ecossistemas e seus serviços, e ampliar o desenvolvimento econômico e potencial de pesca e aquicultura da região.
Nos processos da Bahia de Ilha Grande e Lagoa de Mirim—e em muitos outros recursos naturais compartilhados entre diferentes atores—uma governança adequada se faz essencial, com tomadas de decisões inclusivas, gerando compromissos para cada um dos atores envolvidos. É disso que depende a durabilidade e sustentabilidade de um sistema de uso e conservação.
Da mesma forma, a boa governança é essencial para gerar sistemas resilientes nas comunidades. Esta resiliência é a capacidade de responder e se recuperar de choques como desastres naturais e pragas ou epidemias. Uma grande lição que a COVID-19 nos deixa é a necessidade de fortalecer a resiliência (comida, resposta rápida, sistema de alerta precoce etc.) em nossas comunidades, tanto rurais quanto urbanas.
Boas decisões e políticas públicas assertivas sempre foram fundamentadas em informação de qualidade. Por isso, um dos objetivos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) é apoiar atores e países para que as tomadas de decisão sejam baseadas em evidências e dados científicos.
No Brasil, com recursos GEF, o Programa atuou na criação do Sistema de Informações sobre a Biodiversidade Brasileira. O resultado é um portal online de acesso gratuito, que reúne 15,7 milhões de registros de ocorrência de espécies da fauna e flora nacionais, os quais até então estavam fragmentados em 124 centros de pesquisa de todo o mundo. Para pesquisadores, o sistema é um ativo inestimável, mas vai além ao subsidiar governos, empresas e cidadãos com dados confiáveis sobre seu próprio país.
Esta rica diversidade biológica é a base para ecossistemas equilibrados, que garantem a polinização, o acesso a fontes de água doce e um clima adequado, ou seja, serviços realizados pela natureza que são fundamentais para a agricultura brasileira – mas que muitas vezes não são reconhecidos ou contabilizados.
Por isso, recentemente o PNUMA também começou a trabalhar para compreender o real valor destes serviços para os sistemas alimentares. Além de apoiar o levantamento destas informações, o projeto ainda irá desenvolver ferramentas que permitam incorporar tais valores nas tomadas de decisão.
Em todo o mundo, o PNUMA usa seu expertise para fortalecer padrões e práticas ambientais nos níveis nacional, regional e global. Um exemplo bem sucedido no Brasil é o trabalho com a Associação Nacional dos Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA), com quem o PNUMA já percorreu os 17 estados que abrigam a Mata Atlântica para sensibilizar e fortalecer a capacidade das cidades visando a elaboração de planos de proteção desse bioma tão importante, que beneficia a vida de mais de 70% da população brasileira com serviços ecossistêmicos inestimáveis e fundamentais à saúde pública e à economia.
Experiências como estas mencionadas acima, demonstram que é possível pensar e agir para mudar o nosso relacionamento com a natureza. Esta é uma oportunidade única de trabalhar para a construção de um mundo pós-pandemia, garantindo cada vez mais que haja um equilíbrio entre saúde humana e a saúde do planeta.
*Rafael Zavala é representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) no Brasil e Denise Hamú é representante do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) no Brasil