02 Jan 2020 Reportagem Florestas

De borboleta em borboleta: conservando a floresta e gerando renda

Era uma vez uma floresta tropical que se estendia da Somália a Moçambique. Hoje, não resta muito dela. No Quênia, tudo o que resta da floresta são 42.000 hectares na costa, chamada Floresta Arabuko Sokoke.

“Arabuko Sokoke possui uma biodiversidade muito rica, com mais de 600 espécies de árvores diferentes, 250 espécies de pássaros como o tecelão de Clarke, 230 espécies de mamíferos e espécies de insetos, incluindo mais de 230 borboletas diferentes”, diz Elvis Katana Fondo, assistente de conservação do ecossistema para o Serviço Florestal do Quênia em Kilifi. “Além de um rico ecossistema terrestre, ele também possui um ecossistema marinho exclusivo, com mais de 8.000 hectares de manguezais. Isso faz parte do que torna essa floresta tão especial e por que é um patrimônio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)”.

Para preservar essa floresta única, o Serviço Florestal do Quênia decidiu trabalhar com as comunidades locais, em conformidade com a Lei Florestal de 2005, que estabelece que as comunidades cujo sustento depende da floresta ao seu redor, devem ser incluídas em todas as decisões referentes a ela. O Programa UN-REDD, por meio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), introduziu regras de consentimento livre, prévio e informado que estabelecem uma série de diretrizes sobre como fazer isso acontecer.

Na prática, isso significa que as pessoas que vivem a até 5 quilômetros da floresta precisam se organizar em Associações Comunitárias da Floresta, permitindo que o Serviço Florestal do Quênia trabalhe com elas e lhes conceda direitos para coletar lenha, água e medicamentos fitoterápicos a até um 1 km do perímetro da floresta. Essa floresta foi um dos primeiros lugares no Quênia onde o manejo participativo de florestas foi realizado.

Uma das três associações florestais comunitárias em Arabuko tem 1500 membros, dos quais 85% são mulheres. Segundo seu presidente, Charo Ngumbao, “dos vários grupos de usuários que temos no meu grupo, alguns são pessoas que trabalham em ecoturismo, como com a observação de pássaros. Outros grupos estão envolvidos com apicultura, plantio de árvores e viveiros; outros agem como vigias comunitários para ajudar os guias florestais e, por último, mas não menos importante, há um grupo de mulheres envolvidas na criação de borboletas”.

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As borboletas são polinizadoras e, portanto, muito importantes para os ecossistemas. Foto do Programa UN-REDD

A criação de borboletas foi introduzida em Arabuko Sokoke em 1993 como um projeto da comunidade local para gerar renda diretamente para a comunidade a partir da floresta, a fim de melhorar a conservação dos recursos florestais ameaçados pela exploração excessiva. Jan Godon, ex-chefe da Nature Kenya, estabeleceu a exportação de pupas de borboleta (casulos) para Stratford-upon-Avon no Reino Unido e recentemente foram adicionados novos mercados, incluindo Estados Unidos, Turquia e Dubai. Há remessas semanais e o preço varia de US$0,50 a quase US$2 por borboleta.

“As borboletas, chamadas kipepeo em Kiswahili, saem do casulo na chegada ao seu destino e são usadas para cerimônias de casamento, exposições e colecionadores. Sua vida útil muito curta (até dez dias) faz com que seja uma exportação delicada. Cada espécie de borboleta tem seu próprio valor, dependendo de sua cor, de seu desenho e da dificuldade da sua reprodução, e cada espécie se reproduz em uma árvore indígena específica. Manter a floresta saudável é, portanto, essencial para a sobrevivência das borboletas. Chegamos à conclusão de que não queremos que a floresta seja desmatada”, diz Emily Katana, uma criadora de borboletas. "É o nosso tesouro e fonte de renda".

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Criação de borboletas. Foto do Programa UN-REDD

A criação de borboletas tem seus desafios. “Somos treinados para captura-las a partir das 9h usando bananas e mangas que são colocadas dentro das armadilhas da floresta. À noite, retornamos à floresta para remover as borboletas presas e levá-las para nossos criadouros, onde as alimentamos até que depositem seus ovos, que depois tornam-se lagartas. As lagartas comem folhas até alcançarem o estado de pupas, quando fazem seus casulos. É nesse ponto que as vendemos antes que elas se transformem em borboletas”, diz Katana.

Katana e outras criadoras de borboletas vendem as pupas para a Kipepeo Butterflies House (KBH), uma empresa que compra e vende borboletas para o mercado internacional. "É um produto frágil, mas paga as taxas escolares de nossos filhos, suas roupas e até carteiras para as escolas locais", diz Chenola Tabou, outro membro do grupo de criação de borboletas.

O projeto Kipepeo começou em 1993 com um fundo inicial de US$50.000 fornecido pelo Global Environment Facility e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, mas hoje em dia eles têm uma receita anual de cerca de US$100.000. "Pagamos semanalmente aos agricultores com base no que chegou aos clientes em boas condições", diz o gerente de projeto, Hussein Adulai. "Como é um produto frágil, não há garantia de pagamento. Mas, ainda assim, o negócio cresce desde 2016, apesar da concorrência com a Costa Rica, o Nepal e as Filipinas. Agora somos autossustentáveis e 870 pessoas vivem disso”.

“O fim da pobreza deve acompanhar as estratégias que melhoram a saúde e a educação e incentivam o crescimento econômico, de maneira ambientalmente sustentável. Ajudar a fornecer meios de subsistência alternativos para as comunidades que vivem perto das florestas pode não apenas reduzir a pobreza, mas também ajudar a conservá-las e a combater as mudanças climáticas”, diz Judith Walcott, do Centro de Monitoramento da Conservação Mundial do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em nome do Programa UN-REDD.

 

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