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10 Feb 2022 Reportagem Gênero

Cientista-chefe do PNUMA explica por que precisamos de mais mulheres e meninas na ciência

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11 de fevereiro é o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, que reconhece o papel frequentemente subvalorizado que as mulheres e meninas desempenham na ciência, além de defender seu pleno e igual acesso e participação.

A igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres e meninas é essencial para promover uma ciência confiável, representativa e significativa. Esses valores são a essência da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável e constituem um elemento fundamental da Estratégia de Médio Prazo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Ainda assim, a disparidade de gênero na ciência persiste. Embora as mulheres respondam por 33% do total de pesquisadores, elas são apenas 12% nas instituições nacionais de ciências, segundo o Relatório de ciências da UNESCO 2021. Também tendem a ter carreiras mais curtas e menos remuneradas, e seu trabalho é pouco representado em periódicos de grande destaque.

Conversamos com Andrea Hinwood, Cientista-chefe do PNUMA, sobre o seu trabalho, a importância das abordagens com base na ciência em questões ambientais e como engajar mulheres e meninas nessa área.

Andrea Hinwood
Andrea Hinwood. Foto: PNUMA

Como você descreveria seu primeiro ano como Cientista-chefe do PNUMA?

Andrea Hinwood: Antes de tudo, ter esse papel no PNUMA nos torna humildes. Tenho certeza de que a ciência que o PNUMA usa é robusta, que temos credibilidade, autoridade e, é claro, que a ciência é usada para gerar mudanças em termos de melhoria dos resultados ambientais.

Tenho ajudado a analisar o impacto que estamos tendo sobre um número muito amplo de questões com as quais lidamos. Naturalmente, o método científico é muito útil nessa análise. Estamos desenvolvendo indicadores-chave para o desempenho, e uma das recomendações é fornecer um lugar à mesa para as mulheres como um elemento fundamental de apoio à interface ciência-política.

Introduzimos também um novo sistema automatizado que examina como podemos diversificar nossos produtos para atender às diferentes necessidades do público.

PNUMA: Quão importante é o envolvimento do PNUMA nesse grande número de questões?

AH: O PNUMA tem que estar envolvido em toda a gama de questões ambientais. Acredito que podemos priorizar e concentrar nossos esforços em onde vamos promover mais mudanças de uma maneira que considere o papel das mulheres e das meninas, as desigualdades sociais, a pobreza e outras questões.

Não é possível cuidar do meio ambiente se a desigualdade subjacente não tiver sido tratada.

Se você começar a resolver algumas das dimensões ambientais — segurança alimentar e segurança hídrica — você pode realmente reduzir os conflitos. Então é possível ver algumas mudanças em lugares onde as pessoas possam se engajar mais significativamente na proteção do meio ambiente.

Temos agências parceiras que lidam com todas essas questões. O PNUMA nunca será capaz de fazer isso por conta própria. É preciso formar parcerias com todo o sistema ONU para efetuar mudanças.

Quão importante é a ciência no combate à desinformação ambiental?

AH: É mais importante agora do que nunca. É imprescindível.

O desafio é combater a desinformação ambiental; você tem que tornar suas informações disponíveis e acessíveis a qualquer pessoa do mundo. Uma das coisas que queremos fazer, como uma organização, é tornar nossa ciência aberta e acessível — e, portanto, ganhar credibilidade. Você não ganha credibilidade dizendo: “Confie em mim, eu sou cientista”.

É preciso continuar promovendo essa ciência para se tornar uma voz de confiança e poder mostrar essa comprovação.

Você tem que ampliar a diversidade dos tipos de ciência, abraçar diferentes sistemas de conhecimento e garantir que haja diversidade em termos geográficos e de gênero dentro de sua autoria, as pessoas que revisam e as pessoas que contribuem para os painéis. Acredito que o PNUMA leva isso muito a sério.

No geral, como a ciência pode envolver mulheres e meninas de uma maneira significativa?

AH: Precisamos engajar meninas mais cedo na educação. Precisamos oferecer-lhes oportunidades e falar sobre o que é possível, particularmente nos países em desenvolvimento. E precisamos engajar mulheres e meninas onde elas estão.

Muitas vezes, as pessoas nem se dão conta de que estão 'fazendo ciência'. Tendo trabalhado para agentes de fiscalização, eu costumava ouvir as pessoas dizerem: “Não somos cientistas”, porque eles não tinham um diploma. Mas eles estavam lidando com os problemas usando o método científico: qual é a situação, o que observaram, que informações coletaram, que conclusões tiraram, e como responderam a isso?

Em muitas partes diferentes da sociedade, estamos usando a ciência da maneira como pensamos o tempo todo. Apenas não estamos chamando-a assim.

Como academia, no governo e em lugares como o PNUMA, precisamos garantir que tenhamos mulheres — sejam quais forem seus papéis — para podermos nos engajar. Isso irá melhorar nossos resultados.

O que estamos fazendo na ciência é tentar assegurar que as pessoas considerem os papéis das mulheres e suas atividades em determinadas indústrias.

De certa forma, nos faltam muitos dados. Uma das coisas que podemos fazer é ter mulheres participando de pesquisas — podemos melhorar a ciência e isso resultará em benefício ambiental.

A pandemia de COVID-19 afeta desproporcionalmente as mulheres na ciência e na engenharia. Como podemos superar esse desafio?

AH: Apenas uma pequena parcela dos fundos de recuperação foi utilizada. Há uma oportunidade de analisar algumas dessas questões sistêmicas globalmente e de priorizá-las.

Uma das grandes oportunidades que ainda não aproveitamos ao máximo é que tudo ficou online. Os cursos agora são online, o que significa que se você é uma jovem com acesso à Internet, agora você tem acesso a esse treinamento. Nosso desafio é garantir que haja uma elevação na digitalização e no acesso.

Os custos associados à realização de treinamento on-line também precisam ser significativamente reduzidos.

Quão importante é para as mulheres e meninas ter bons exemplos, e que conselho você daria àquelas interessadas em se envolver mais na ciência?

AH: Quando eu era uma mulher jovem, sempre nos disseram que a ciência era difícil. Que não era para meninas.

Há uma enorme pressão para cumprir papéis específicos. Tive muita sorte de minha mãe ter me encorajado. Eu me casei. Tenho um casal de filhos e pude fazer isso ao longo desse processo.

Eu gostaria de incentivas as mulheres jovens a procurarem ajuda onde quer que possam encontrar, se realmente quiserem algo. Buscar mentoria e orientação para ajudá-las a alcançar seus objetivos.

Penso que é importante que as mulheres jovens tenham confiança em si mesmas porque muitas vezes — do ponto de vista social — elas não têm. Elas têm que ouvir aquela voz dentro de si mesmos que diz: “Eu gosto muito de matemática, ou adoro programação, biologia ou animais”.

Sempre encorajei as mulheres jovens a seguirem essa luz.

Às vezes, não será fácil. Mas nada que valha a pena é fácil.

 

Para garantir acesso pleno e igualitário de mulheres e meninas, bem como a participação delas, na ciência, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a resolução A/RES/70/212 em 2015, que reconhece o dia 11 de fevereiro como o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência.

 

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