24 Apr 2019 Reportagem

Uma cozinha essencial para combater o desperdício de alimentos

Quando foi a última vez que você abriu a geladeira e teve que jogar algo fora? Para muitos de nós, isso é mais comum do que gostaríamos de admitir.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) estima que, todos os anos, um terço dos alimentos produzidos não chegam nem mesmo às mesas do consumidor.

Isso representa um enorme desperdício e ineficácia – questões de destaque no mais recente Resumo de Políticas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, uma publicação da ONU Meio Ambiente.

Reduzir o desperdício de alimentos está entre as cinco principais preocupações da transição para estilos de vida mais sustentáveis. Mas ter sucesso nessa área exige ações em todos os níveis.

Como indivíduos, nós podemos combater o desperdício de alimentos cozinhando menos, compartilhando com os vizinhos, comprando alimentos considerados “feios”, fazendo compostagem e conscientizando as nossas comunidades. No entanto, mudanças sistemáticas nas grandes indústrias também são necessárias para enfrentar o problema global do desperdício de alimentos.

“Indivíduos, assim como fornecedores de alimentos, podem reduzir o desperdício ao planejar quais alimentos são necessários, conceber pratos que usem sobras e gerenciar como armazenar alimentos de forma que o frescor seja maximizado”, aponta Garrette Clark, chefe de programa da ONU Meio Ambiente para Estilos de Vida Sustentáveis.

A especialista afirma ainda que problemas sistemáticos mais amplos podem ser combatidos de diferentes formas: empenhar-se na procura por alimentos produzidos de forma sustentável; falar sobre alimentos saudáveis e sustentáveis com vendedores e produtores; evitar embalagens em excesso; ou começar projetos de hortas urbanas, escolares ou em cozinhas. Ao mesmo tempo, também é preciso apoiar organizações e políticas que promovam sistemas alimentares mais sustentáveis.

Naomi
Naomi MacKenzie de 26 anos é co-fundadora da start up Suiça KITRO. Foto: KITRO

Naomi MacKenzie, de 26 anos, cofundou uma organização para responder a esses desafios. Sua startup KITRO, sediada na Suíça, oferece uma solução automatizada para a captura de dados e para combater o desperdício de alimentos na chamada indústria da hospitalidade — que reúne os setores de eventos, gastronomia, turismo e hotelaria. 

Você acha que a indústria da hospitalidade está se tornando mais sustentável?
Com certeza, ela tem mudado para melhor. Muitos grupos hoteleiros agora possuem equipes corporativas de responsabilidade social, estratégias de sustentabilidade e cargos como gerentes de sustentabilidade. Isto é uma tendência crescente e positiva.  

Por que você quis trabalhar especificamente nesta questão ambiental? 
Eu e meu cofundador passamos muitas horas trabalhando em cozinhas e em bufês na indústria da hospitalidade. Como funcionários iniciantes das equipes, nós nos víamos jogando fora grandes quantidades de alimentos diariamente. As coisas tendem a acontecer de forma rápida nas cozinhas e manter uma visão geral do que está sendo jogado fora é difícil. Quando começamos a buscar soluções para medir o desperdício de alimentos, descobrimos que as opções existentes eram manuais. Tornou-se claro que, para responder ao desperdício de alimentos, deveríamos descobrir qual comida está sendo jogada fora e quanto de comida está sendo desperdiçada.Nosso objetivo na KITRO é fornecer uma solução de longo prazo que se torne tão essencial para uma cozinha quanto uma lava-louças ou um fogão e ajudar empresas a monitorarem o desperdício de alimentos ao longo do tempo. Geramos dados através de soluções automatizadas que se incorporam perfeitamente aos cotidianos das cozinhas e serviços.

Qual impacto ambiental positivo você espera ter através do seu produto?
Se você olhar uma geração para trás, os alimentos tinham um valor muito mais alto. Nós pensávamos antes de jogar algo fora. Conforme os alimentos foram ficando mais baratos, perdemos a noção do que significa produzir uma cenoura, por exemplo – dos recursos hídricos que são usados nisso, do trabalho, da embalagem, do transporte. Nosso objetivo é aumentar a conscientização sobre o desperdício de alimentos e mostrar para os consumidores — incluindo as grandes empresas e a indústria — que, embora o desperdício de alimentos seja um grande problema, é possível tomar uma decisão e fazer uma mudança positiva.

KITRO Machine
Este eletrodoméstico de cozinha, escaneia e analisa a comida jogada fora.. Foto: KITRO

Você acha que a indústria da hospitalidade está se tornando mais sustentável?
Com certeza, ela tem mudado para melhor. Muitos grupos hoteleiros agora possuem equipes corporativas de responsabilidade social, estratégias de sustentabilidade e cargos como gerentes de sustentabilidade. Isto é uma tendência crescente e positiva.

Quais foram os principais obstáculos para criar e aperfeiçoar o seu produto?
Nós queríamos construir um produto baseado em tecnologia – mas a gente não sabia nem programar! Este foi um grande obstáculo. Mas como tivemos que refletir e explicar o nosso projeto de forma clara para outras pessoas, o fato de nós mesmos não conseguirmos construir o nosso produto acabou sendo positivo. Em segundo lugar, nós tivemos sorte de receber apoio ao longo do caminho, mas começar uma empresa na Suíça exige muitos recursos financeiros. Nosso primeiro cliente, o restaurante Holy Cow, manifestou interesse pelo nosso projeto com base apenas nas nossas ideias colocadas numa folha de papel. A Unicorn Labs, uma associação que constrói protótipos para novas ideias, construiu o produto de graça, arcando com os custos materiais em troca de divulgação e reconhecimento da nossa colaboração. Houve muitos agentes que nos ajudaram a superar a turbulência financeira, mas continuou sendo um desafio.

Qual o seu conselho para jovens empreendedores que querem começar uma empresa para ajudar a lutar por um futuro sustentável?
Tudo demora mais do que você espera. Seja para construir um hardware, angariar fundos, contratar pessoas – o inesperado acontece e dura para sempre. Em uma startup, a velocidade e a agilidade são consideradas importantes, mas é sempre melhor ser generoso quando calcular prazos. Considerar um prazo externo para compartilhar e um interno com precauções adicionais. Em segundo lugar, se você precisar de algo, peça ajuda. A pior coisa que pode acontecer é alguém dizer não. Pedir ajuda abriu muitas portas para nós. Como uma equipe muito jovem, nós não tínhamos muita experiência em abrir ou administrar um negócio, mas com apoio nós conseguimos construir uma empresa dinâmica.  

KITRO Team
Com o apoio certo, a KITRO se tornou uma empresa dinâmica, motivada a ajudar na redução do desperdício de alimentos. Foto: KITRO

O Prêmio Jovens Campeões da Terra, apoiado pela Covestro, reconhece e celebra jovens empreendedores trabalhando pelo meio ambiente. Os vencedores de 2019 serão anunciados em Setembro. As aplicações para 2020 serão abertas em Janeiro. Fique atento!