06 de fevereiro de 2020 Reportagem Climate Action

Pior infestação de gafanhotos em décadas ameaça segurança alimentar no Chifre da África, afirma especialista em clima do PNUMA

Entrevista com Richard Munang, especialista em clima e África do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)

As nações da África Oriental estão enfrentando enxames de gafanhotos do deserto desde o início de 2020. Considerado o pior surto que a região já viu em décadas, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação adverte que o número crescente de gafanhotos do deserto é uma ameaça alarmante e extrema à segurança alimentar e aos meios de subsistência no Chifre da África.

Segundo a recente atualização da organização sobre o aumento de gafanhotos no deserto, a situação pode ser ainda agravada por conta de novas criações de gafanhoto que produzirão mais infestações na Etiópia, no Quênia, na Somália e possivelmente em países mais distantes.

Entrevistamos Richard Munang, especialista em clima e África do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), sobre a relação entre fatores ambientais, mudança climática e a situação emergencial dos gafanhotos.

Qual é a relação entre gafanhotos e mudanças climáticas?

Durante períodos calmos, conhecidos como recessões, gafanhotos do deserto geralmente ficam restritos aos desertos áridos e semiáridos da África, Oriente Próximo e Sudoeste da Ásia, que recebem menos de 200 mm de chuva anualmente. Em condições normais, o número de gafanhotos diminui pela mortalidade natural ou pela migração.

No entanto, os últimos cinco anos foram mais quentes do que qualquer outro desde a revolução industrial e desde 2009. Pesquisas associam o clima mais quente a enxames de gafanhotos mais prejudiciais. A África é afetada desproporcionalmente, já que 20 dos países com o mais rápido aquecimento do mundo estão lá. O clima úmido também favorece a multiplicação de gafanhotos. As chuvas que atingiram o Chifre da África de outubro a dezembro de 2019 foram incomumente fortes, 400% acima da quantidade normal de chuva. Essas chuvas anormais foram causadas pelo dipolo do Oceano Índico, um fenômeno acentuado pelas mudanças climáticas.

Como países e indivíduos podem se preparar?

Embora a mudança climática seja um fenômeno global, a África se destaca por sua vulnerabilidade, principalmente pela predominância de baixos níveis de desenvolvimento socioeconômico. As pessoas que vivem na pobreza enfrentam crescentes vulnerabilidades aos impactos das mudanças climáticas por não terem recursos para uma rápida recuperação. Neste caso, os gafanhotos do deserto estão devastando as plantações antes da colheita, acabando com a alimentação de animais e animais selvagens e, com isso, prejudicando a economia, os bens e os meios de subsistência.

A implantação de soluções de ação climática, como a descentralização de secadores solares para atores da cadeia de valor agregado, pode garantir que eles possam ganhar até 30 vezes mais, preservando sua colheita e vendendo durante a entressafra ou oferecendo flexibilidade para compensar eventos imprevisíveis, como esses enxames de gafanhotos. Também pode criar oportunidades empresariais para cadeias de valor auxiliares na fabricação desses secadores solares. Intervenções como essa são críticas para aumentar a resiliência climática para algumas das comunidades mais vulneráveis ​​do continente.

Como os gafanhotos podem ser controlados?

O controle dos enxames de gafanhotos do deserto é feito principalmente com produtos químicos organofosforados por pulverizadores aéreos montados em veículos e, em menor grau, por pulverizadores manuais.

Uma pesquisa extensa está em andamento sobre controle biológico e outros meios de controle não químicos, com o foco atual em patógenos e reguladores de crescimento de insetos. Até agora, o controle por predadores e parasitas naturais é limitado, já que os gafanhotos podem se afastar rapidamente da maioria dos inimigos naturais. Apesar das pessoas e dos pássaros comerem gafanhotos, isso não é o suficiente para reduzir significativamente seus níveis populacionais em grandes áreas.

Qual é o papel das Nações Unidas no controle de gafanhotos?

A resposta das Nações Unidas ao controle de ataques de gafanhotos é de natureza multiagente. Apesar do setor de risco imediato ser o da segurança alimentar, as mudanças climáticas desempenham um papel agravante.

Um dos papéis do PNUMA é disseminar o conhecimento científico mais recente sobre tendências climáticas emergentes para informar políticas intersetoriais e garantir resiliência nos setores relevantes.

O papel da Organização Meteorológica Mundial é prever as mudanças climáticas mais imediatas que possam intensificar os ataques dos gafanhotos.

Embora a forma tradicional de controle seja o uso de pesticidas, o impacto desses produtos químicos no meio ambiente e em outros ecossistemas fundamentais para a segurança alimentar, como os de abelhas e outros insetos, os quais não apenas polinizam até 70% dos nossos alimentos, mas também podem ter um impacto na saúde humana, não pode ser esquecido. O papel da Organização Mundial da Saúde é classificar os riscos potenciais de diferentes agentes químicos para permitir que os governos invistam no mais seguro.

Um dos mandatos das Organizações Alimentares e Agrícolas é fornecer informações sobre a situação geral dos gafanhotos e emitir alertas e previsões oportunas para os países sob risco de invasão. A organização opera um serviço centralizado de informação sobre gafanhotos do deserto. Além disso, capacitar as comunidades com tecnologias para agregar valor, como secadores solares, que também são soluções de ação climática, lhes permite preservar suas colheitas. Isso possibilita uma colheita antecipada no início dos ataques, o que garante a proteção da maior parte de sua produção.

Para imprensa, por favor entre em contato:

Roberta Zandonai, Gerente de Comunicação Institucional, PNUMA, roberta.zandonai@un.org